quarta-feira, 6 de abril de 2011

"A Sombra e a Escuridão", a história dos leões de Tsavo.


A construção da ponte em Tsavo

Em Março de 1898 os ingleses trabalhavam na construção de uma ferrovia no Quênia, leste da África. Para a construção de uma ponte sobre o rio Tsavo,o Coronel John Henry Patterson (1865-1947) engenheiro construtor de pontes,  foi admitido em  pela Companhia Britânica da África do Leste para supervisionar a sua construção,chegou à Mombasa, na costa, em 1º. de março. Viajou  para Tsavo, a  160 quilômetros da costa, onde encontrou uma paisagem de árvores baixas e esquálidas, espessa vegetação rasteira e espinheiros. 
John Henry Patterson (1867-1947) nasceu na Irlanda e entrou para o Exército Britânico aos 17 anos. Lutou na Guerra dos Boers e na 1ª. Guerra Mundial, e deixou o exército em 1920 após 35 anos de serviço. Passou seus últimos anos na Califórnia junto com a esposa Francis, onde ambos faleceram. Apesar de protestante, foi um grande defensor do Sionismo, seu corpo foi cremado e as cinzas enviadas para Israel. Poucos dias após sua chegada, soube que dois leões foram vistos rondando os arredores e que trabalhadores indianos começaram a desaparecer.Esse era o começo de uma carnificina que perduraria por cerca de nove meses.Os leões fracassaram nas sua primeiras tentativas de ataque,mas se tornaram ousados e experientes,fazendo com que pessoas se tornassem sua presa preferencial. As "bomas" (cerca de espinhos),não foram suficientes para deter os grandes felinos que encontravam pontos fracos em sua estrutura ou até mesmo saltavam por cima destas. Fogo ou mecanismos de som também não os assutavam. Do acampamento os trabalhadores podiam ouvir o som dos felinos devorando algum de seus companheiros a poucos metros dali,nem mesmo os tiros disparados em sua direção  intimidava os animais. A coincidência dos ataques e da chegada de Patterson fez com que os trabalhadores lhe atribuissem má sorte. Os trabalhadores passaram a acreditar que os leões eram demônios e que não poderiam ser mortos.Eles estavam totalmente convencidos de que os espíritos revoltados partiram de dois chefes indígenas que tomaram aquelas formas, a fim de protestar contra a estrada de ferro que estava sendo construída em seu país, e decidiram parar o seu progresso para vingar o insulto A costrução da ponte chegou a ficar parada durante 3 semanas devido a grande evasão de trabalhadores assustados com os ataques.Apesar de todas as medidas tomadas como as barreiras de espinhos em torno dos acampamentos, fogueiras durante a noite e rigoroso toque de recolher após o anoitecer, os ataques aumentaram vertiginosamente.Patterson realizou incontáveis vigílias noturnas sem resultado, e até construiu um vagão-armadilha, mas quando um dos leões finalmente se deixou apanhar, os atiradores indianos do outro lado das barras (trilhos de trem) ficaram tão apavorados que apenas conseguiram feri-lo levemente. Uma bala perdida soltou uma das barras da porta e o leão escapou. O que mais impressionava era a forma  incomum de abordagem, visto que eles atacavam sempre em dupla, e de forma estratégica e coordenada. Acredita-se que durante esses meses eles foram responsáveis por cerca de 140 mortes,embora os registros oficiais atribuem apenas 28,mas eles também foram responsáveis por dizimar parte da população local,do qual não há registro oficial.Conforme os relatos do Coronel Patterson, os leões caçavam em conjunto, e arrastavam suas vítimas a uma caverna para devorá-las. Esta versão é contestada por arqueólogos que dizem ser costumes tribais fazerem rituais humanos em cavernas da região e portanto, os ossos encontrados por Patterson não são evidência que aqueles homens foram vítimas dos leões. Várias teorias foram formuladas para explicar o comportamento anormal dos felinos,entre elas:
-A eclosão em 1898 de uma doença (Rinderpest disease) teria dizimado as presas usuais dos leões (herbívoros selvagens e gado doméstico), obrigando-os a procurar outra fonte de alimento.
-Os leões teriam se acostumado a encontrar cadáveres nas imediações do vau do Rio Tsavo. Caravanas de escravos vindas de Zanzibar passavam rotineiramente por ali., o que contribuiu para o número de corpos abandonados. 
 -Cremação incompleta praticada por trabalhadores hindus da ferrovia. Os leões se habituaram a procurar os corpos e desenterrá-los. 

- Doenças dentárias que podem ter prejudicado o comportamento normal de caça, embora esta alegação seja controversa.




Coronel John Henry Patterson (1865-1947)




O vagão-armadilha, que falhou


Patterson em  sua tenda






"Boma" (cerca de espinhos)
Plataforma de tiro sobre uma árvore




A morte do primeiro leão, 09/dezembro/1898 : 


 Pela manhã os leões haviam atacado um dos acampamentos, mas só conseguiram matar um burro. Ao seguir os rastros, Patterson descobriu um dos leões escondido em um espesso matagal. Reunindo um bando de trabalhadores indianos, fez com que avançassem em direção ao matagal, produzindo grande barulho com latas e gritos. Patterson colocou-se do lado oposto e aguardou. Como esperado, o leão, perturbado pela barulhada crescente, abandonou o burro morto e fugiu exatamente na direção do caçador. Patterson fez cuidadosa pontaria e puxou o gatilho, mas o rifle, que recebera emprestado recentemente, falhou. O susto foi grande e Patterson esqueceu-se de disparar o cano esquerdo , pois estava acostumado com seu próprio rifle, que era de repetição. Felizmente o leão só pensava em fugir e não o atacou. No último momento Patterson disparou o cano esquerdo e atingiu o leão, sem detê-lo contudo.

Como o burro ainda estava quase inteiro, Patterson supôs que um dos leões poderia voltar à noite e mandou construir um “machan” a uns três metros da carcaça, pois não havia qualquer árvore apropriada por perto. O “machan” tinha quatro metros de altura, constituído por quatro postes cravados no chão, inclinados para dentro, sustentando no topo uma tábua que servia de assento.

Ao anoitecer Patterson assumiu sua posição, e horas depois, na escuridão, ouviu o leão se aproximar denunciado por ligeiros ruídos no mato. Mas o leão ignorou a carcaça do burro e ficou mais de duas horas rodeando o “machan” e rugindo. Com os nervos à flor da pele, Patterson esperava que a qualquer momento o leão tentasse escalar a frágil estrutura ou pulasse até ele. Como se não bastasse, uma coruja veio voando e chocou-se contra sua cabeça, dando-lhe tremendo susto. Finalmente Patterson conseguiu distinguir a forma do leão o suficiente para tentar um disparo; o leão respondeu com tremendo rugido e começou a saltar em todas as direções. Patterson não podia mais vê-lo mas continuou atirando seguidamente na direção dos ruídos, que cessaram afinal. Só ao amanhecer Patterson desceu do “machan” e encontrou o leão morto, atingido duas vezes : uma bala entrou atrás do ombro esquerdo e atingiu o coração, e a outra atingiu uma perna traseira. 
  





Patterson e o leão FMNH 23970, morto em 09/12/1898






A morte do segundo leão, 29/dezembro/1898 :

Por sorte o primeiro leão morto era o maior matador de pessoas, e Patterson não relata em seu livro novas mortes. Ele não diz o dia exato em que, ao vigiar as carcaças de algumas cabras mortas pelo leão restante, conseguiu acertá-lo no ombro usando uma espingarda de dois canos carregada com balas sólidas (slugs). O leão foi derrubado mas levantou-se e fugiu antes que Patterson pudesse usar o rifle.

Menciona então que decorreram uns dez dias de calma, até que na noite do dia 27 o leão reapareceu e tentou agarrar alguns indianos que dormiam em uma árvore, e ele só pôde espantá-lo a tiros. Na noite seguinte Patterson e seu ajudante Mahina ficaram na mesma árvore, na esperança que o leão voltasse. E voltou mesmo; Patterson conta que ficou fascinado ao observar a fera habilmente usar cada arbusto disponível para se aproximar desapercebida. Esperou o leão se aproximar bastante, menos de vinte metros, e disparou seu rifle .303, acertando no peito, sem derrubá-lo. O leão fugiu em grandes saltos, e mais três tiros foram disparados, acertando o último.

Logo que amanheceu, Patterson arranjou um rastreador nativo e também levou Mahina com uma carabina Martini. Haviam percorrido menos de meio quilômetro quando o leão os atacou; o primeiro tiro somente o tornou mais furioso, e o segundo o derrubou. Mas o leão se levantou e continuou avançando, e um terceiro tiro não causou efeito aparente. Ao tentar pegar a Martini, Patterson descobriu que Mahina havia se apavorado e já estava no alto de uma árvore. Só restava a Patterson fugir também para a árvore, o que conseguiu por pouco. O leão, apesar de uma perna traseira quebrada por um dos tiros, quase o agarrou. Apoderando-se da carabina, Patterson atirou, e o leão caiu e ficou quieto. Empolgado, Patterson desceu da árvore imprudentemente e dirigiu-se para o leão, que imediatamente se levantou e atacou de novo. Mas um tiro no peito e outro na cabeça o mataram finalmente, e o leão tombou a menos de cinco metros de Patterson. Havia seis buracos de bala no corpo, e Patterson encontrou também uma das balas da espingarda cravada superficialmente na carne. 
 Cada leão media mais de três metros de comprimento do focinho à ponta da cauda e foram necessários oito homens para carregá-los de volta ao acampamento.



Recomeço




Patterson foi imediatamente declarado um herói pelos trabalhadores e pelas populações locais, e a notícia do ocorrido rapidamente se espalhou por toda parte, como evidenciado pelos telegramas posteriores de felicitações que recebeu.Com a ameaça dos leões assassinos finalmente eliminada, os trabalhadores finalmente retornaram a Tsavo e a ponte ferroviária foi concluída em fevereiro de 1899. Patterson detalhou os ataques dos Leões em seu livro The Man-Eaters of Tsavo. O livro foi um grande sucesso o que lhe rendeu uma boa quantia em dinheiro, os crânios e peles foram vendidos para o Chicago Field Museum, nos Estados Unidos.


Disputa internacional

O Museu Nacional do Quênia diz que os animais representam uma parte importante da história do país e, portanto, deveriam fazer parte de seu acervo e de uma exposição itinerante que está sendo organizada.
"Vamos usar protocolos internacionais para repatriá-los...Seria bom tê-los de volta", disse Connie Maina, uma porta-voz do museu no Quênia.

Os leões de Tsavo

Os leões de Tsavo eram uma subspécie sem juba.A questão da falta de juba tem sido estudada, e causas como desequilíbrio hormonal (testosterona), parasitas e alimentação foram avaliadas. Um nível excessivo de testosterona poderia provocar um efeito similar à calvície nos leões e torná-los mais agressivos. Há inclusive casos documentados de uma situação oposta : leoas que desenvolveram jubas por desequilíbrio hormonal. Entre os problemas sugeridos - também teriam problemas nos dentes que por essa debilidade seria responsável por os levarem a procurar presas mais fáceis que seriam humanos dormindo. A própria revista 'Nature' relaciona diferenças nos dois casos onde os atuaispoderia demonstrar como efeitos provocados pela destruíção do habitat, mediante ao aumento populacional desordenado das cidades e a caça indiscriminada do próprio e suas presas que seria não umfenômeno isolado mas com equivalentes de ursos e outras espécies em todo mundo, o que facilitaria encontros do qual são normalmente fatais graças a força dos leões onde somente uma patada seria capaz de quebrar ossos e destruir órgãos internos reduzindo a chance desobrevivência a menos 40%. Os números se tornam alarmante onde somente na Tanzânia cerca de 900 ataques com 560 vítimas fatais foram registrados nos últimos 15 anos e na Étiopia tais ataques são relatados em sua maioria lavradores e crianças atacados durante o dia. 


Chicago Field Museum (EUA)



 






"A Sombra e a Escuridão"











Crânio de um dos leões


Mandíbulas do leão FMNH 23970 : canino inferior direito
fraturado (e abscesso), incisivos inferiores faltando,
crescimento excessivo dos incisivos superiores direitos,
má oclusão do canino superior direito. Notar a forte
assimetria das mandíbulas.







Detalhe das mandíbulas do leão FMNH 23969, mostrando
um dente carniceiro superior esquerdo fraturado, e a
polpa exposta.
Filme

A história dos leões deu origem ao filme "A Sombra e a Escuridão" de 1996.



12 comentários:

  1. Parabéns pelo artigo muito bem elaborado e detalhado.
    A forma como descreveu o ocorrido e as imagens que ajudam a compreensão do caso ficaram ótimas.
    Melhor trabalho apresentado em PT BR na internet.

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  2. Uma merda de filme valeu pelo resumo me salvou¡

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    1. A coitada sabe de nada inocente kkkkkkkkk burrinha burrinha.

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  3. A história real da caça aos leões foi mais interessante que a do filme, impressionante mesmo!

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  4. A história real da caça aos leões foi mais interessante que a do filme, impressionante mesmo!

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  5. Este comentário foi removido pelo autor.

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  6. Quando fui no museu de Chicago no ano passado me aprocimei dos leões e olhei nos olhos deles para ver se eu iria sentir medo mesmo, e senti. Não sei se foi coisa da minha cabeça.... Mais posso dizer que eles são assustadoramente concentrados. Parece estar vivos e na espreita. Amei muito o museu. História verdadeira sempre me ganhou. Nota mil pelo documentário

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  7. Quando fui no museu de Chicago no ano passado me aprocimei dos leões e olhei nos olhos deles para ver se eu iria sentir medo mesmo, e senti. Não sei se foi coisa da minha cabeça.... Mais posso dizer que eles são assustadoramente concentrados. Parece estar vivos e na espreita. Amei muito o museu. História verdadeira sempre me ganhou. Nota mil pelo documentário

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  8. Quando fui no museu de Chicago no ano passado me aprocimei dos leões e olhei nos olhos deles para ver se eu iria sentir medo mesmo, e senti. Não sei se foi coisa da minha cabeça.... Mais posso dizer que eles são assustadoramente concentrados. Parece estar vivos e na espreita. Amei muito o museu. História verdadeira sempre me ganhou. Nota mil pelo documentário

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  9. Excelente documentário. Muito parecido com o filme que por sinal também foi muito fiel ao livro de Jhonn Patterson e belicima atuação dos atores Wal kilmer e Michael Douglas.

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